Processo n.º 762/16.3T8LSB.E1
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Sumário:
1 – No âmbito de uma relação contratual
de mediação imobiliária em regime de não exclusividade e ressalvando a hipótese
prevista na 2.ª parte do n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, a empresa mediadora
só adquire o direito à remuneração por efeito da conclusão e perfeição do
negócio que a concreta actividade de mediação que desenvolveu teve em vista.
2 – Nessas circunstâncias, se a empresa
mediadora angariar um interessado para a compra de determinada fracção
autónoma, mas esse negócio não chegar a ser celebrado, não terá direito à
remuneração, ainda que o mesmo interessado venha, posteriormente, a comprar uma
outra fracção autónoma do mesmo edifício, à mesma pessoa, através de outra
empresa mediadora, e que esta última fracção também fosse objecto do contrato
de mediação celebrado pela primeira empresa mediadora.
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Relatório
A,
Mediação Imobiliária, Unipessoal, Lda. propôs a presente acção declarativa, com
processo comum, contra Banco, S.A., pedindo a condenação deste último a pagar-lhe
a quantia de € 6.150, acrescida de juros moratórios desde a citação até
integral pagamento.
O réu contestou, pugnando pela sua
absolvição do pedido.
Foi proferido despacho saneador.
Realizou-se a audiência final.
Foi proferida sentença, julgando a acção improcedente
e absolvendo o réu do pedido.
A autora interpôs recurso da sentença, formulando as
seguintes conclusões:
1) Vem o presente recurso de apelação interposto da
sentença proferida pelo Tribunal a quo
que decidiu a presente acção improcedente.
2) A recorrente não se conformando com o teor da
sentença recorrida apresenta pois as seguintes alegações de recurso, impugnando
de facto e de direito.
3) Considerou a recorrente que o Tribunal a quo mal andou, ao julgar provados os
factos nºs 26 e 27 da decisão impugnada, e, ainda, deu como não provado o facto
nº 30.
4) A recorrente na impugnação da matéria de facto
realizou a reapreciação da prova gravada, quanto às declarações prestadas por NV,
JD e AC, cujas transcrições se encontram na secção II do capítulo da impugnação
da matéria de facto e cujo teor se dá por transcrito.
5) Assim, em sequência, entende a recorrente que
relativamente à matéria de facto impugnada, os factos provados 26.º e 27.º da
sentença recorrida, devem ser dados como não provados, porquanto:
- Resultou da produção de prova, contrariamente à
posição sufragada pelo Tribunal a quo,
que a empresa ACR, Lda., através do Sr. FO, contactou os interessados NV e JD, e não estes a contactar aquela.
- Resultou que tal contacto ocorreu após os interessados
supra mencionados pretenderem desistir do negócio e reaverem o seu sinal, por a
fracção N demorar a ser vendida aos mesmos.
- Resultou que o recorrido Banco, S.A. tinha acesso aos contactos dos
interessados NV e JD, desde logo porque os mesmos já
tinham financiamento aprovado para aquisição da fracção N.
- Resultou que entre a empresa HG e o Banco, S.A. foi acordado, por escrito, em Outubro
de 2014, que aquela iria passar a gerir e vender os imóveis pertencentes a
esta.
- Resultou que a HG no âmbito de um protocolo de
cooperação contratou a empresa ACR, Lda., representada por FO, para mediar as vendas dos imóveis que constituem escopo nos
autos.
6) Logo, entendeu-se, salvo melhor opinião, que, em
função do princípio de um bom pai de família, que foi o Banco, S.A. quem cedeu à empresa ACR,
Lda., os contactos dos
interessados para lhes informar da disponibilidade da fracção X.
7) Consequentemente, entende ainda a recorrente que os
factos provados n.ºs 26.º e 27.º devem ser dados como não provados porque os
citados NV e JD não contactaram a empresa ACR, Lda.,
para aquisição da fracção X, antes foram os mesmos contactados pela mencionada
empresa para proceder à compra de outro imóvel distinto do previamente acordado
com o Banco,
S.A. e mediado pela A.
Venerandos Juízes,
8) Relativamente ao facto não provado n.º 30,
constante da decisão impugnada, considera a recorrente, que
9) Em face da impugnação aduzida quanto aos factos
provados nºs 26 e 27, cujo teor dá por reproduzido, é entendimento da
recorrente que o Banco, S.A., contrariamente,
ao entendimento proferido pelo Tribunal a
quo, agiu com o intuito preclaro de defraudar e enganar e lesar os
interesses da A em prol de outra entidade com quem operava.
10) Agindo a sociedade recorrida, no entender da
recorrente, em total e manifesto abuso de direito em relação a esta, desde
logo, por violar a boa fé e a lealdade negocial assumida.
Ora, Venerandos Julgadores,
11) Da prova produzida e impugnada, preclaro se torna
que foi a recorrente quem angariou, agiu, e praticou os actos considerados nas
alegações de recurso junto dos clientes NV e JD,
para aquisição dos apartamentos que constituem o objecto do contrato de
mediação em apreço nos autos.
12) Ou seja, cumpriu à recorrente mediar o negócio,
aproximar os interessados com vista à aquisição pelos mesmos daquilo que era,
afinal, o objecto da mediação junto do cliente, e tudo promoveu para que o
mesmo se efectivasse.
13) Factos a que a recorrente não era alheia, até
porque o financiamento foi desde logo aprovado para os interessados adquirirem
a fracção N.
14) E só por culpa da recorrida o negócio não se
efectivou por motivos de legalização do imóvel.
15) Motivo pelo qual o facto não provado nº 30 deve
ser dado como provado.
16) A recorrente veio ainda impugnar a matéria de
direito, constante da sentença recorrida, entendendo que o Tribunal a quo violou o disposto no art. 19º nº 1
da Lei nº 15/2013 de 8.2.
Porquanto,
17) Por contrato escrito celebrado entre as partes
litigantes (doc. Nº 1 junto com a PI), a recorrente obrigou-se perante a
recorrida a diligenciar no sentido de angariar clientes para aquisição das
fracções Z, R, M, X, AD, N e T, no prédio em escopo nos presentes autos.
Sendo que,
18) Como resultou provado nos factos 7º, 8º 9º, 10º,
11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18º, 19º, 20º, 22º, 23º, 24º, foi a actuação
decisiva da recorrente que aproximou a recorrida dos interessados na aquisição
dos imóveis que constituíam o objecto do contrato de mediação imobiliário
acordado entre as partes e ainda naqueles que foram alvo da impugnação à
matéria de facto.
19) Com efeito, foi devido ao esforço da
mediadora/recorrente que desenvolveu as provadas actividades no sentido de
angariar um interessado(s) para a celebração do negócio, que o negócio visado
pelo contrato de mediação se veio a concretizar, não pela fracção N mas antes
pela fracção X (que também constituía o objecto do acordo de mediação) e, com
efeito, este negócio foi celebrado com um terceiro angariado pela mediadora (NV e JD), sendo que o foi de tal modo que se pode afirmar que
a conclusão do contrato foi o resultado da actividade desenvolvida pela
mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao
negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa.
20) Tem sido entendimento generalizado na
jurisprudência que o mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem
direito à remuneração convencionada com o cliente se o negócio visado vier a
ser concluído e desde que a celebração deste tenha sido o corolário ou a
consequência da sua actividade – exigindo-se um nexo causal entre a sua
actuação (no âmbito da mediação) e a outorga do contrato visado (competindo ao
mediador a alegação e prova dos pressupostos do seu direito, particularmente da
verificação desse mesmo nexo causal).
21) Neste sentido Ac. TRC de 17.12.2014, proc.
242/11.3TBNZR.C1, Catarina Gonçalves; Ac. RL de 07.04.2003, Roque Nogueira;
Acórdão do STJ, de 12-12-2013 (Granja da Fonseca).
22) É entendimento da recorrente que, o Tribunal a quo, violou o disposto no art. 19º nº
1 da LEI nº 15/2013 de 8.2, atento o que supra se demonstrou.
23) Logo é entendimento da recorrente, que a mesma,
salvo o devido respeito, tem direito à remuneração peticionada nos presentes
autos porque foi devido aos esforços por esta encetados entre os interessados e
o cliente Banco,
S.A. que o negócio de
compra da fracção autónoma designada pela letra X veio a ocorrer (A tal não
será alheio o facto de o sinal constituído pelos interessados aquando da
reserva da fracção N, no montante de € 2500, acabou por servir para amortizar o
preço da fracção X).
Nestes termos e nos melhores de direito, com o douto
suprimento de V. Exa., deve o presente recurso proceder, por provado, e, em
consequência:
A) Ser alterada a matéria de facto impugnada, em
conformidade com os argumentos expendidos nas presentes alegações e conclusões
de recurso;
B) Ser declarado verificado o direito da recorrente à
remuneração pela sua actividade de mediação imobiliária em conformidade com a
causa de pedir e tema da prova;
C) Ser a sentença recorrida revogada e substituída por
outra que condene a R no pedido da recorrente;
Com o que se fará a tão costumada Justiça.
O recorrido contra-alegou, formulando as seguintes
conclusões:
Da impugnação da matéria de facto:
1) O Tribunal a
quo julgou (bem) provados os seguintes factos, ora impugnados pela
Recorrente:
«26. A Fracção X foi
vendida mediante a intervenção da empresa ACR, Lda..
27. Com a qual os
compradores respectivos contactaram, como interessados, para aquisição da
referida Fracção X.»
2) Vem a recorrente impugnar a decisão sobre a matéria
de facto, quanto a estes pontos, por entender que «os factos provados n.º 26º e 27º devem ser dados como não provados
porque os citados NV e JD não contactaram a empresa ACR,
Lda., para a aquisição da fracção X, antes foram os mesmos
contactados pela mencionada empresa para proceder à compra de outro imóvel
distinto do previamente acordado com o Banco, S.A. e mediado pela A».
3) Porém, nenhum elemento de prova carreado para os
presentes autos permite afirmar que foi a ACR, Lda. a efectuar o primeiro contacto com
os compradores.
4) Ainda que assim não fosse, e se desse como provado
que a ACR, Lda. contactou
os compradores em primeiro lugar, esse facto não contraria os factos constantes
dos pontos da matéria de facto ora em causa.
5) Ficou provado que a A, Mediação Imobiliária, Unipessoal, Lda. não teve qualquer intervenção na
compra e venda da fração X – interveio apenas na tentativa malograda de vender
a fracção N –, tendo sido a ACR, Lda. a mediar a venda desta fracção, conforme pode retirar-se dos
depoimentos prestados, nomeadamente pela testemunha NG e pela testemunha NV, na audiência final.
6) Os próprios compradores confirmam a autonomia dos
negócios, assim como a vontade de, por um lado, desistir da compra da fracção
N, e, por outro lado, comprar a fracção X, como é o caso da testemunha JD.
7) Não havendo, portanto, qualquer fundamento para que
seja alterada a matéria de facto fixada pelo Tribunal a quo.
8) Vem ainda a recorrente impugnar a decisão sobre a
matéria de facto na parte em que se dá como não provado o seguinte:
«30. O referido em 24 e
26 ocorreu com o intuito de enganar ou defraudar e lesar os interesses da
Autora».
9) Porém, não resultou sequer provado que tivesse sido
o Banco, S.A. a fornecer os contactos dos
compradores à ACR, Lda.
e menos ainda que o tenha feito com o intuito de enganar ou defraudar e lesar
os interesses da autora, ora recorrente.
10) Em suma, não há quaisquer alterações a fazer,
devendo manter-se a decisão sobre a matéria de facto, nos precisos termos da sentença
recorrida.
Da fundamentação de direito:
11) O Tribunal a
quo andou bem ao julgar improcedente a presente acção, ancorando a sua
decisão no entendimento de que «parece
inequívoco que a Autora mediou a alienação da fracção N, que não se veio a
consumar (antes os interessados tendo comprado a fracção X), motivo pelo qual,
por tal via e tendo presentes os termos do contrato celebrado entre as partes,
não será, naturalmente, devida qualquer remuneração, visto que o negócio
mediado não se concretizou (sendo certo que o contrato de mediação celebrado
entre as partes previa um regime de exclusividade por apenas 30 dias, já há
muito decorridos aquando da celebração do contrato de compra e venda da fracção
X)».
12) Ficou provado que, por um lado, a A, Mediação Imobiliária,
Unipessoal, Lda. interveio
exclusivamente na tentativa malograda de venda da fracção N, e que, por outro
lado, a ACR, Lda. foi a
única mediadora imobiliária com intervenção na venda da fracção X.
13) Nos termos do disposto nas cláusulas 5.1 e 5.3 do
Contrato de Mediação Imobiliária, junto com a petição inicial como Doc. n.º 1,
o direito a honorários por parte da Autora, ora recorrente, dependia da efectiva
venda da fracção em causa, dispondo especificamente o referido ponto 5.3 que «os honorários da mediadora serão devidos
após a concretização do negócio, ou seja, após a celebração das Escrituras
Públicas de Compra e Venda».
14) Ao que acresce que a recorrente não tinha, nos
termos desse contrato, exclusividade na mediação da venda, decorridos que
fossem 30 dias de vigência do contrato. Ora, o referido contrato de mediação
imobiliária é datado de 9 de Junho de 2014 e a intervenção da recorrente na
venda da Fracção N iniciou-se, conforme a própria alega na petição inicial, só
em Setembro de 2014, esgotado, pois, que estava, amplamente, o referido período
de exclusividade.
15) Afirma a recorrente que tem «direito à remuneração
peticionada porque foi devido aos esforços por esta encetados entre os
interessados e o cliente Banco, S.A. que o negócio de compra da fracção
autónoma designada pela letra X ocorreu», invocando em sustento da sua posição
um Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 17 de dezembro de 2014,
processo n.º 242/11.3TBNZR.C1, relatora: Catarina Gonçalves.
16) No entanto, esta jurisprudência não será de
aplicar ao caso sub judice, porquanto
pressupõe que se está a falar da realização do mesmo negócio, ou, no mínimo, de
negócio com o mesmo objecto. E em momento algum a A, Mediação Imobiliária,
Unipessoal, Lda.
contribuiu para o negócio que incidiu sobre a fracção X, tendo sido essa
negociação, e respectiva venda, inteiramente levada a cabo pela ACR,
Lda..
17) Conclui-se que a decisão recorrida não viola o
disposto no artigo 19.º, n.º 1, da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, por não
se verificarem os pressupostos da sua previsão. Razão pela qual deve ser
mantida a decisão recorrida.
Termos em que, deverá ser negado provimento ao recurso
em apreço, mantendo-se a sentença proferida pelo Tribunal a quo.
O recurso foi admitido.
Objecto
do recurso
É entendimento uniforme que é pelas
conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o
âmbito de intervenção do tribunal de recurso (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º,
n.º 1, do CPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha
(artigo 608.º, n.º 2, ex vi artigo
663.º, n.º 2, do CPC). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo
o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
As questões a resolver são as seguintes:
- Impugnação da matéria de facto;
- Se é devida remuneração à recorrente.
Factualidade apurada
Na sentença recorrida, foram julgados provados os seguintes factos:
1. A autora é uma empresa que se dedica
à actividade de mediação imobiliária, sendo detentora da licença AMI nº 9879.
2. A autora celebrou com o réu, no dia
09/06/2014, um acordo denominado de “Contrato de Mediação Imobiliária”, que
consta de fls. 14 e ss. e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
3. Acordo este pelo qual a autora se
obrigou com o réu a diligenciar no sentido de angariar e negociar com
potenciais interessados para a compra das fracções autónomas - M, N, R, T, X, Z
-, sitas em (…), Condomínio (…), Bls. 1, 2 e 3, freguesia e concelho de (…), descrito
na CRP de (…) pelo n.º (…), pelos preços ali convencionados.
4. O citado acordo foi feito pelo prazo
de 12 meses, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de
tempo, salvo rescisão de uma das partes mediante o pré-aviso escrito de dez
dias, antes do prazo terminar.
5. Nos termos do referido acordo, após a
venda de cada fracção indicada em 3, cumpria ao réu, a título de honorários,
pagar à autora as quantias indicadas na cláusula 5.
6. Nos termos da cláusula 8.3 do
mencionado acordo, cumpria às partes contratantes não utilizar a informação
obtida no desenvolvimento dos serviços acordados, em benefício próprio ou de
terceiros, e a qualquer título não abrangido pelo acordo.
7. No decorrer do mês de Setembro de
2014, a autora obteve dois interessados na aquisição da fracção N, pelo preço
considerado no acordo de mediação imobiliária.
8. Os interessados na aquisição da
citada fracção “N” foram NV e JD.
9. A autora comunicou ao réu, no dia
30/09/2014, por e-mail, que havia obtido tais interessados para a aquisição do
citado imóvel.
10. Bem como a autora ia comunicando com
o réu o desenrolar dos actos desenvolvidos junto dos interessados, através dos
representantes do réu nos seus balcões de atendimento junto do concelho de (…).
11. A autora, no dia 01/10/2014,
outorgou, com os citados interessados na aquisição do imóvel, documento no qual
estes procediam à reserva da citada fracção “N”, mediante a entrega de sinal de
reserva no valor de € 2.500.
12. Tendo o interessado JD, no dia 01/10/2014, procedido ao
depósito da quantia de € 2.500 para reserva da acima identificada fracção
autónoma.
13. Os interessados na aquisição da
fracção “N” subscreveram, no dia 23/12/2014, um acordo epigrafado de
“contrato-promessa de compra e venda”, em que o réu Banco, S.A.,
figurava como promitente vendedor e os interessados como promitentes-compradores,
relativo à fracção N, que consta de fls. 24 e ss. e que aqui se dá por
reproduzido.
14. Os interessados já haviam solicitado
crédito hipotecário ao réu para aquisição do imóvel em apreço.
15. Crédito este que, em Novembro de
2014, foi aprovado a favor dos interessados para a aquisição da citada fracção.
16. Acontece que o réu, de imediato, não
podia proceder à venda aos interessados da citada fracção N por problemas com o
licenciamento camarário.
17. No dia 26/01/2015, o colaborador da autora,
NG, remeteu a JX, colaborador do réu, o mail que consta de fls. 30 e que aqui
se dá por reproduzido, onde entre o mais se refere: “Envio-lhe mais uma vez e-mail, por forma a questioná-lo em relação ao
ponto de situação, licenças, visitas? (…) Como deve calcular, como mediadores,
temos o dever de prestar os devidos esclarecimentos aos nossos clientes, esses
que constantemente nos contactam, questionam e pedem-nos informações, às quais
infelizmente não podemos responder, muito por falta do nosso parceiro de
negócio (Banco, S.A.), que nem responde aos emails enviados
(…)”.
18. Em resposta, o citado JX procedeu à
comunicação que consta de fls. 32 e que aqui se dá por reproduzida, onde entre
o mais se refere: “(…) 1. As anomalias
identificadas dentro dos apartamentos estão corrigidas. 2 Temos todos os
elementos solicitados pela CM (…), excepto a certificação dos elevadores. 3. A
administração do condomínio não deu autorização para a realização dos trabalhos
de construção civil e nos três elevadores pela Schindler, necessários à
certificação dos mesmos. 4. Aguardamos autorização da administração do
condomínio, processo este que estamos a tentar desbloquear e sem o qual,
impossibilita a obtenção de licenças de utilização. 5. Após autorização da
administração do condomínio, informá-lo-ei para que os clientes possam visitar
os apartamentos (…)”.
19. A interessada Noélia Vaz, no dia
26/01/2015, remeteu para o Banco, S.A., na pessoa de CK, a
comunicação constante de fls. 31, onde entre o mais refere que: “(…) Mas quem é a administração do
condomínio? O problema que vemos aqui é dinheiro para certificar os elevadores…
Primeiro era a licença de habitação, agora é os elevadores…(…)”.
20. Tendo a sobredita CK respondido a NV
através do mail que consta de fls. 31 e que aqui se dá por reproduzido, onde
entre o mais se refere que: “(…) Os
contratos deverão ser acompanhados da cópia do talão de depósito referente ao
sinal. (…)”.
21. Em 02/03/2015 a interessada NV remete a NG a comunicação constante de
fls. 33, que aqui se dá por reproduzida, e onde, entre o mais, se refere que “Já há novidades no que concerne à
licença/casa…? Continuamos à espera! Mais informo que estou a ficar com alguns
problemas (…) Fui contactada pela Conforama que precisam de entregar a sala,
pois apenas guardam as coisas por 60 dias e já lá vão 90! O mesmo se passa com
os electrodomésticos… (….) Pois nós comprámos tudo em Dezembro, sendo que o
crédito foi aprovado no início de Novembro. Ninguém nos informou destes
problemas todos, daí comprámos tudo! (…) Se o crédito estava aprovado à partida
não havia problemas, seria só marcar a escritura (…)”.
22. JD, NV e
o réu concretizaram, em 18/09/2015, o negócio de compra e venda da fracção
autónoma designada pela letra “X”, correspondente ao segundo andar – bloco dois
– apartamento 22, com direito ao uso exclusivo de uma boxe, designada pelo nº
G09, do prédio descrito na CRP de (…) sob o nº (…), pelo preço de € 105.000.
23. Tendo o réu - Banco, S.A. - mutuado aos compradores e mutuários JD e NV a quantia de € 78.750, destinado à aquisição do imóvel
constante no ponto antecedente.
24. O réu e os interessados acima
identificados alteraram a intenção de adquirir a fracção N que constituía o ensejo
acordado dos interessados, passando a adquirir ao réu a fracção X.
25. O réu foi interpelado pela autora,
em 23/11/2015, para proceder ao pagamento da comissão à autora, no prazo de 8
dias.
26. A fracção X foi vendida mediante a
intervenção da empresa ACR,
Lda..
27. Com a qual os compradores
respectivos contactaram, como interessados, para aquisição da referida Fracção
X.
28. Com efeito, em Outubro de 2014, o Banco, S.A. contratou os serviços da empresa HG para lhe dar apoio na gestão do seu
património imobiliário.
29. A HG promoveu a intervenção da mediadora imobiliária acima
referida para operar, nessa qualidade, na eventual alienação das fracções
integradas no mesmo edifício.
A sentença recorrida julgou não provado
o seguinte facto:
30. O referido em 24 e 26 ocorreu com o
intuito de enganar ou defraudar e lesar os interesses da autora.
Fundamentação
1
A recorrente afirma que o tribunal recorrido cometeu
um erro de julgamento ao, por um lado, julgar provados os factos n.ºs 26 e 27
e, por outro, julgar não provado o facto n.º 30. No seu entendimento, os factos
n.ºs 26 e 27 deviam ter sido julgados não provados e o facto n.º 30 devia ter
sido julgado provado, pretendendo a alteração da decisão sobre a matéria de
facto em conformidade. Para sustentar esta tomada de posição, a recorrente
invoca os depoimentos das testemunhas NV, JD e
AC.
O artigo 662.º, n.º 1, do CPC, estabelece que a
Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos
tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem
decisão diversa. Escreve, a propósito, ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, que “a
Relação tem autonomia decisória,
competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a
reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se
mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que
concerne à identificação dos pontos de discórdia” (Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4.ª edição, p. 274).
Prossegue o mesmo Autor: “sem embargo das modificações que podem ser
oficiosamente operadas relativamente a determinados factos cuja decisão esteja
eivada de erro de direito, por violação de normas imperativas, à Relação não é
exigido, nem lhe é permitido que, de motu
próprio, se confronte com a generalidade
dos meios de prova que estão sujeitos a livre apreciação e que, ao abrigo desse
princípio foram valorados pelo tribunal de 1.ª instância, para deles extrair,
como se se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo
contrário, as modificações a operar devem respeitar o que o recorrente, no
exercício do seu direito de impugnação
da decisão da matéria de facto, indicou nas respectivas alegações que circunscrevem o objecto do recurso” (p. 279-280). À
objecção de que a Relação, por apenas ter ao seu dispor, além do conteúdo
material dos autos, a gravação das provas prestadas oralmente, assim ficando
impedida de percepcionar a totalidade dos elementos de comunicação não verbais
que possam ter sido relevantes para a formação da convicção do juiz da primeira
instância, responde o Autor que vimos citando que tais circunstâncias “deverão
ser ponderadas na ocasião em que a Relação procede à reapreciação dos meios de
prova, evitando a introdução de alterações quando, fazendo actuar o princípio
da livre apreciação das provas, não seja possível concluir, com a necessária
segurança, pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos
pontos de facto impugnados. (…) se a Relação, procedendo à reapreciação dos meios de prova postos à disposição do tribunal a quo, conseguir formar, relativamente
aos concretos pontos impugnados, a convicção acerca da existência de erro deve
proceder à correspondente modificação da decisão” (p. 287-288).
Analisemos, à luz destas regras, a pretensão da recorrente.
A sentença recorrida julgou provado que a fracção X
foi vendida mediante a intervenção da empresa A Chave da Retoma, Lda. (facto n.º 26). Ora, a argumentação
exposta pela recorrente, sintetizada nos n.ºs 5 a 7 das suas conclusões, em
nada contende com este facto, antes visando a questão de saber quem efectuou o
primeiro contacto, decidida no n.º 27 da sentença recorrida. Mais, no n.º 7 das
suas conclusões, a recorrente admite expressamente que foi a ACR, Lda. quem interveio na compra e venda da
fracção X. No que concerne à prova, resulta dos depoimentos das testemunhas NV,
JD, AC e PP, não contrariados por qualquer
outro meio de prova, que, efectivamente, foi a ACR, Lda. quem interveio na compra e venda da
fracção X. Concluímos, pois, que a sentença recorrida decidiu a matéria do n.º
26 em conformidade com a prova produzida, inexistindo erro de julgamento.
Por outro lado, a sentença recorrida julgou provado
que foram os compradores, NV e JD, quem
contactou a ACR, Lda.
para a aquisição da fracção X (n.º 27). Neste ponto, a recorrente tem razão,
pois inexistiu prova desse facto. NG e SM nada sabiam sobre esta matéria. NV não foi precisa, pois referiu a
existência de contactos, mas não quem teve a iniciativa dos mesmos. JD afirmou que, após desistirem da
compra da fracção N, lhes surgiu um contacto e a oportunidade de adquirirem a
fracção X. Instado a precisar esta afirmação, JD respondeu “o contacto chegou-nos, não sei dizer”,
acrescentando que, provavelmente, terá sido o Sr. FO, da ACR, Lda. e que nem sequer se recordava se foi
ele próprio ou NV a
receber tal contacto. AC
nada disse com interesse para a decisão do facto em questão. PP afirmou que foram os compradores a
abordar a ACR, Lda., mas
sem conhecimento directo de tal facto. Perante este conjunto de depoimentos
testemunhais e na falta de outros meios de prova, inexistia, como referimos,
fundamento para julgar provado o que consta do n.º 27. Verificou-se, pois, erro
de julgamento quanto a este concreto ponto da matéria de facto, pelo que o conteúdo
do n.º 27 dos factos provados passará a constar da matéria de facto não
provada, tal como a recorrente pretende.
Finalmente, inexiste fundamento para julgar provado o
conteúdo do n.º 30 da sentença recorrida, ou seja, que o recorrido e os
compradores, NV e JD, deixaram de efectuar a compra e
venda da fracção N e efectuaram a compra e venda da fracção X, mediante a
intervenção da ACR, Lda., com o intuito de enganar ou de defraudar e lesar os
interesses da recorrente. Aquilo que resulta da prova testemunhal é
precisamente o contrário, ou seja, que as razões que levaram NV e JD a desistirem da compra da
fracção N e, posteriormente, a comprarem a fracção X, são perfeitamente
compreensíveis. Assim, NG,
SM, NV e JD convergiram na afirmação de que se
verificou uma demora anormal entre o momento da reserva da fracção N e aquele
em que a venda podia ser efectuada e de que tal demora causou grande
descontentamento aos dois últimos, que constantemente reclamavam e pediam
explicações. Nestas circunstâncias, o facto de NV e JD – que, saliente-se, fizeram a reserva por um prazo de apenas 30 dias,
como resulta do documento de fls. 21 – terem desistido da aquisição da fracção
N ao fim de cerca de 9 meses de espera surge como natural e foi
convincentemente justificado pelos próprios nos depoimentos que prestaram. No
que toca ao surgimento do interesse de NV e de JD pela aquisição da fracção X, também os depoimentos por estes prestados
são absolutamente convincentes e afastam a ideia de que tenha havido uma
“troca” de fracções com o intuito de prejudicar a recorrente. Com efeito, ambos
foram claros no sentido de que a hipótese de compra da fracção X apenas surgiu
depois de terem desistido da compra da fracção N e na sequência de desistência
por parte da pessoa que havia reservado a primeira. NV foi ainda muito clara sobre a razão
por que ela e JD decidiram comprar a fracção X, à qual nunca haviam tido
acesso, por estar reservada para outrem: gostaram muito dela; inclusivamente,
acharam-na melhor que a N. Não quiseram enganar ou defraudar a recorrente. O
recorrido, por seu turno, limitou-se a vender a fracção que os compradores
escolheram. Perante isto, é evidente a falta de fundamento para julgar provado
o conteúdo do n.º 30 da sentença recorrida, não merecendo esta última censura
nesse aspecto.
Concluindo: A única alteração a introduzir na decisão
sobre a matéria de facto consiste em o conteúdo do n.º 27 passar a constar da
matéria de facto não provada.
Assim, a matéria de facto relevante para a decisão da
causa fica fixada nos seguintes termos:
Factos provados:
1. A autora é uma empresa que se dedica à actividade
de mediação imobiliária, sendo detentora da licença AMI nº 9879.
2. A autora celebrou com o réu, no dia 09/06/2014, um
acordo denominado de “Contrato de Mediação Imobiliária”, que consta de fls. 14
e ss. e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
3. Acordo este pelo qual a autora se obrigou com o réu
a diligenciar no sentido de angariar e negociar com potenciais interessados
para a compra das fracções autónomas - M, N, R, T, X, Z -, sitas em (…), Condomínio (…), Bls. 1, 2 e 3, freguesia e concelho
de (…), descrito na CRP
de (…) pelo n.º (…), pelos preços ali convencionados.
4. O citado acordo foi feito pelo prazo de 12 meses,
renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, salvo
rescisão de uma das partes mediante o pré-aviso escrito de dez dias, antes do
prazo terminar.
5. Nos termos do referido acordo, após a venda de cada
fracção indicada em 3, cumpria ao réu, a título de honorários, pagar à autora
as quantias indicadas na cláusula 5.
6. Nos termos da cláusula 8.3 do mencionado acordo,
cumpria às partes contratantes não utilizar a informação obtida no
desenvolvimento dos serviços acordados, em benefício próprio ou de terceiros, e
a qualquer título não abrangido pelo acordo.
7. No decorrer do mês de Setembro de 2014, a autora
obteve dois interessados na aquisição da fracção N, pelo preço considerado no
acordo de mediação imobiliária.
8. Os interessados na aquisição da citada fracção “N”
foram NV e JD.
9. A autora comunicou ao réu, no dia 30/09/2014, por
e-mail, que havia obtido tais interessados para a aquisição do citado imóvel.
10. Bem como a autora ia comunicando com o réu o
desenrolar dos actos desenvolvidos junto dos interessados, através dos
representantes do réu nos seus balcões de atendimento junto do concelho de (…).
11. A autora, no dia 01/10/2014, outorgou, com os
citados interessados na aquisição do imóvel, documento no qual estes procediam
à reserva da citada fracção “N”, mediante a entrega de sinal de reserva no
valor de € 2.500.
12. Tendo o interessado JD, no dia 01/10/2014, procedido ao
depósito da quantia de € 2.500 para reserva da acima identificada fracção
autónoma.
13. Os interessados na aquisição da fracção “N”
subscreveram, no dia 23/12/2014, um acordo epigrafado de “contrato-promessa de
compra e venda”, em que o réu Banco, S.A., figurava como promitente vendedor e os interessados como
promitentes-compradores, relativo à fracção N, que consta de fls. 24 e ss. e
que aqui se dá por reproduzido.
14. Os interessados já haviam solicitado crédito
hipotecário ao réu para aquisição do imóvel em apreço.
15. Crédito este que, em Novembro de 2014, foi
aprovado a favor dos interessados para a aquisição da citada fracção.
16. Acontece que o réu, de imediato, não podia
proceder à venda aos interessados da citada fracção N por problemas com o
licenciamento camarário.
17. No dia 26/01/2015, o colaborador da autora, NG, remeteu a JX, colaborador do réu, o mail que
consta de fls. 30 e que aqui se dá por reproduzido, onde entre o mais se
refere: “Envio-lhe mais uma vez e-mail,
por forma a questioná-lo em relação ao ponto de situação, licenças, visitas?
(…) Como deve calcular, como mediadores, temos o dever de prestar os devidos
esclarecimentos aos nossos clientes, esses que constantemente nos contactam,
questionam e pedem-nos informações, às quais infelizmente não podemos
responder, muito por falta do nosso parceiro de negócio (Banco, S.A.), que nem responde aos emails
enviados (…)”.
18. Em resposta, o citado JX procedeu à comunicação que consta de
fls. 32 e que aqui se dá por reproduzida,
onde entre o mais se refere: “(…) 1. As anomalias identificadas dentro dos
apartamentos estão corrigidas. 2 Temos todos os elementos solicitados pela CM (…), excepto a certificação dos
elevadores. 3. A administração do condomínio não deu autorização para a realização
dos trabalhos de construção civil e nos três elevadores pela Schindler,
necessários à certificação dos mesmos. 4. Aguardamos autorização da
administração do condomínio, processo este que estamos a tentar desbloquear e
sem o qual, impossibilita a obtenção de licenças de utilização. 5. Após
autorização da administração do condomínio, informá-lo-ei para que os clientes
possam visitar os apartamentos (…)”.
19. A interessada NV, no dia 26/01/2015, remeteu para o Banco, S.A., na pessoa de CK, a comunicação constante de fls. 31,
onde entre o mais refere que: “(…) Mas
quem é a administração do condomínio? O problema que vemos aqui é dinheiro para
certificar os elevadores… Primeiro era a licença de habitação, agora é os
elevadores…(…)”.
20. Tendo a sobredita CK respondido a NV através do mail que consta de fls. 31 e que aqui se dá por
reproduzido, onde entre o mais se refere que: “(…) Os contratos deverão ser acompanhados da cópia do talão de
depósito referente ao sinal. (…)”.
21. Em 02/03/2015 a interessada NV remete a NG a comunicação constante de fls. 33,
que aqui se dá por reproduzida, e onde, entre o mais, se refere que “Já há novidades no que concerne à
licença/casa…? Continuamos à espera! Mais informo que estou a ficar com alguns
problemas (…) Fui contactada pela Conforama que precisam de entregar a sala,
pois apenas guardam as coisas por 60 dias e já lá vão 90! O mesmo se passa com
os electrodomésticos… (….) Pois nós comprámos tudo em Dezembro, sendo que o
crédito foi aprovado no início de Novembro. Ninguém nos informou destes
problemas todos, daí comprámos tudo! (…) Se o crédito estava aprovado à partida
não havia problemas, seria só marcar a escritura (…)”.
22. JD, NV e o réu
concretizaram, em 18/09/2015, o negócio de compra e venda da fracção autónoma
designada pela letra “X”, correspondente ao segundo andar – bloco dois –
apartamento 22, com direito ao uso exclusivo de uma boxe, designada pelo nº
G09, do prédio descrito na CRP de (…) sob o n.º (…), pelo preço de € 105.000.
23. Tendo o réu Banco, S.A. mutuado aos compradores e mutuários JD e NV a quantia de € 78.750, destinado à aquisição do
imóvel constante no ponto antecedente.
24. O réu e os interessados acima identificados
alteraram a intenção de adquirir a fracção N que constituía o ensejo acordado
dos interessados, passando a adquirir ao réu a fracção X.
25. O réu foi interpelado pela autora, em 23/11/2015,
para proceder ao pagamento da comissão à autora, no prazo de 8 dias.
26. A fracção X foi vendida mediante a intervenção da
empresa ACR, Lda..
27. Com efeito, em Outubro de 2014, o Banco, S.A.
contratou os serviços da empresa HG para lhe dar apoio na gestão do seu património imobiliário.
28. A HG promoveu a intervenção da mediadora imobiliária acima
referida para operar, nessa qualidade, na eventual alienação das fracções
integradas no mesmo edifício.
Factos não provados:
A) JD e NV contactaram
a sociedade ACR, Lda.,
como interessados, para aquisição da fracção X.
B) O referido em 24 e 26 ocorreu com o intuito de
enganar ou defraudar e lesar os interesses da autora.
2
Comecemos
por um breve enquadramento jurídico da situação dos autos.
O
exercício da actividade de mediação imobiliária está actualmente regulado pela
Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro.
O artigo
2.º, n.º 1, desta lei, estabelece que a actividade de mediação imobiliária
consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de
destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou
aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse
ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham
por objecto bens imóveis. O n.º 2 do mesmo artigo dispõe que a actividade de
mediação imobiliária consubstancia-se também no desenvolvimento das seguintes
acções: a) Prospecção e recolha de informações que visem encontrar os bens
imóveis pretendidos pelos clientes; b) Promoção dos bens imóveis sobre os quais
os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da
sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões.
O artigo
19.º, n.º 1, da mesma lei, estabelece que a remuneração da empresa de mediação
imobiliária é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo
exercício da mediação; porém, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no
contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa
nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra. O n.º 2 estatui
que é igualmente devida, à empresa de mediação imobiliária, a remuneração
acordada, nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido
celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao
cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
No caso
dos autos, está provado que a recorrente, no exercício da actividade que
constitui o seu objecto, celebrou, com o recorrido, no dia 09.06.2014, um
contrato de mediação imobiliária mediante o qual se obrigou a diligenciar no
sentido de angariar e negociar com potenciais interessados a compra das
fracções autónomas M, N, R, T, X, Z sitas em (…), Condomínio (…), Bls. 1, 2 e
3, freguesia e concelho de (…), descrito na CRP de (…) pelo n.º (…), por determinados
preços. Foi estipulado, nomeadamente, que o prazo de vigência do contrato era
de 12 meses, com renovação automática por iguais e sucessivos períodos de
tempo, salvo rescisão de uma das partes mediante pré-aviso escrito de dez dias
antes do prazo terminar; que, durante os primeiros 30 dias de vigência do
contrato, a recorrente era contratada em regime de exclusividade (6.1. do
contrato de mediação); que, findo esse período inicial de 30 dias, a recorrente
era contratada em regime de não exclusividade (6.1. do contrato de mediação); e
que, após a venda de cada uma das referidas fracções, cumpria ao recorrido
pagar à autora, a título de honorários, as quantias indicadas na cláusula 5.
Em
Setembro de 2014, a recorrente angariou dois interessados na aquisição da
fracção N, NV e JD, facto que comunicou ao recorrido.
Posteriormente, a recorrente foi comunicando ao recorrido o desenrolar dos
actos desenvolvidos junto de NV
e JD. No dia 01.10.2014, a recorrente outorgou, com NV e JD, um documento mediante o qual estes procederam à reserva
da fracção N, mediante a entrega de sinal de reserva no valor de € 2.500, tendo
o interessado JD procedido
ao depósito desse valor. Em Novembro de 2014, o recorrido aprovou a concessão
de crédito a NV e JD para a aquisição da fracção N. No dia
23.12.2014, NV e JD subscreveram
um documento epigrafado de “contrato-promessa de compra e venda”, relativo à
fracção N, no qual o recorrido figurava como promitente-vendedor e aqueles como
promitentes-compradores.
Portanto,
a recorrente praticou diversos actos de execução do contrato de mediação, tendo
em vista a celebração de um contrato de compra e venda da fracção N entre o
recorrido e os referidos interessados. Porém, esse contrato de compra e venda
não chegou a ser celebrado, pelo que, nos termos do n.º 1 do citado artigo 19.º
da Lei n.º 15/2013, a recorrente não tem direito à remuneração estipulada.
Note-se que NV e JD foram angariados como interessados na
compra da fracção N fora do período de exclusividade do contrato de mediação,
pelo que está excluída, sem necessidade de outras indagações, a aplicabilidade
do n.º 2 do mesmo artigo.
A isto,
a recorrente contrapõe que foi ela quem angariou NV e JD, aproximando-os do recorrido “na aquisição dos imóveis que
constituíam o objecto do contrato de mediação imobiliária”, que esses
interessados, embora não comprando a fracção N, acabaram por comprar a fracção
X e que esta última também era objecto do contrato de mediação imobiliária que
o recorrido consigo celebrou. Na tese da recorrente, é indiferente que NV e JD tenham acabado por comprar a fracção X
e não a N, dada a descrita conjugação de circunstâncias, que permitem “afirmar
que a conclusão do contrato foi o resultado da actividade desenvolvida pela
mediadora em virtude de esta se integrar na cadeia de factos que deram lugar ao
negócio pretendido, ainda que não tenha sido a única causa”.
Porém, a
recorrente não tem razão.
Note-se,
em primeiro lugar, que a recorrente angariou NV e JD apenas
com vista à compra e venda da fracção N e não, como vem sustentar nas suas
alegações de recurso, “dos imóveis que constituíam o objecto do contrato de
mediação imobiliária”. Foi a fracção N que NV e JD
reservaram perante a recorrente, foi para esse fim que eles entregaram a
quantia de € 2.500 e nunca o relacionamento comercial entre eles teve por
objecto outra fracção.
NV e JD acabaram por não comprar a fracção N. É quanto basta para
concluir, tendo em conta o disposto no n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 15/2013,
que a recorrente não tem direito a qualquer remuneração. É certo que a
recorrente acaba por não obter qualquer compensação pela actividade de mediação
que desenvolveu com vista à venda da fracção N a NV e JD, mas, atento o regime de não exclusividade então vigente,
isso é um risco próprio do seu ramo de negócio, face ao disposto na lei.
Não
releva que, posteriormente, NV
e JD tenham comprado a
fracção X ao recorrido. Nunca a recorrente desenvolveu qualquer actividade com
vista à venda desta fracção a NV
e JD, inexistindo
fundamento para afirmar que estes compraram a mesma fracção graças à actividade
por aquela desenvolvida. Ao contrário do que a recorrente sustenta nas suas
alegações de recurso, não se provou a existência de um nexo de causalidade
entre a actividade de mediação por si desenvolvida e a aquisição da fracção X
por NV e JD, pela simples
razão de que a referida actividade não teve por objecto a venda realizada, mas
uma outra, que não se concretizou. Tanto quanto se provou, a celebração do
contrato de compra e venda da fracção X resultou exclusivamente da actividade
de mediação levada a cabo por uma empresa de mediação imobiliária diversa da
recorrente.
Note-se,
por último, que, se se tivesse provado que o recorrido e os compradores, NV e JD, deixaram de efectuar a compra e venda da fracção N e
efectuaram a compra e venda da fracção X com o intuito de enganar ou de
defraudar e lesar os interesses da recorrente, poderia, eventualmente,
equacionar-se uma solução jurídica diversa da exposta com fundamento no
disposto nos artigos 334.º ou 762.º, n.º 2, do Código Civil. Porém, tal prova
não foi feita, pelo que a questão não se coloca.
Em
conclusão, o recurso deverá ser julgado improcedente, confirmando-se a sentença
recorrida.
Decisão
Acordam os juízes do
Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente, confirmando a sentença
recorrida.
Custas
a cargo da recorrente.
Notifique.
*
Évora, 25 de Janeiro de 2018
Vítor
Sequinho dos Santos (relator)
1.ª
adjunta
2.º
adjunto